terça-feira, 19 de janeiro de 2010

PADRE JULIÃO: Por Alino Matta Santana

Há aproximadamente quarenta anos, em meados de 1969, eu era Vice-Diretor da Escola de Agronomia da UFBA, e certo dia, como o diretor estava em Salvador, achando-me no exercício da direção, recebi no meu gabinete um senhor muito simpático com aspecto e fala de estrangeiro, que me disse chamar-se Julian Claes e ser padre e agrônomo. Em conversas preliminares ele demonstrou ter interesse em conseguir algum espaço na Escola de Agronomia para exercitar seus conhecimentos na área agronômica. Fiquei deveras impressionado com aquele homem que logo na chegada a Cruz das Almas demonstrava, objetivamente, um grande interesse não só em exercer seu ministério presbiteral, como trabalhar em uma área em que também era diplomado. Ele tinha poucos dias na nossa terra, já que aqui chegou em março de 1969. Conseguimos encaixa-lo em um projeto.Na nossa Centenária Casa de Ensino ele trabalhou num projeto que testou o manejo de uma pequena propriedade familiar. Logo depois com recursos de doações da Bélgica começou dois projetos de colonização, sendo um em Sapeaçu e outro em Maragogipe. Nessas duas áreas ele criou Escolas Rurais. Em Sapeaçu foi a escola Rural Lagoa de Jurema e em Guapira, Maragogipe, criou a Escola Rural Campinas. Nessas escolas, centenas de jovens e crianças estudaram. Os tempos foram se passando e a cada dia aumentava minha admiração por aquele virtuoso senhor. Notava que ele exercia sua espiritualidade no trabalho em prol dos que dele precisavam. Era ele um autêntico seguidor de Cristo.Se Cristo passou na sua vida terrena fazendo cego enxergar, paralítico andar, surdo ouvir, morto ressuscitar e tanto mais, assim Padre Julião – como passou a ser conhecido aqui no Brasil - tinha que sua vida não se resumia a impor normas e medidas, mas trabalhar para melhorar a vida dos irmãos que sofrem e propiciar as condições para que muitos jovens se levantassem da escravidão da ignorância e do analfabetismo.Mas, queridos irmãos, minha estima pelo Padre Julião não residia só nisso; entusiasmava-me mais vê-lo tratar carinhosamente a todos indistintamente, não havia privilégios para os ricos e poderosos. Nunca perseguiu qualquer pessoa, jamais dificultou que cada um desse vazão aos seus dons. Ele também teve por todo o tempo em que viveu aqui entre nós, um extraordinário respeito às tradições religiosas do nosso povo - o que para ele era bem mais difícil já que oriundo de um país europeu. Ele nunca quis impor idéias suas para modificar os atávicos comportamentos religiosos do povo. As rezas, as imagens, as mensagens próprias das comunidades, as maneiras das pessoas se vestirem, as argumentações, as músicas e tudo mais em torno das tradições do povo ele respeitava, porque que era um homem que estudou, viajou, viveu e tinha consciência exata do que pregou Jesus; sabia que o mais importante era o âmago da fé cristã, ou seja, o amor e que o resto era complementação. O pensamento dele era que tradições não prejudicavam nem davam sentido ao cristianismo, senão cairíamos nas idéias de outros cristãos que julgam que mulheres cortarem cabelo e vestirem calças, trabalhar aos sábado, dançar e tantas outras bobagens possam suplantar a essência da fé. Ele sabia que vivíamos em uma comunidade com diversas tendências comportamentais e que não podia padronizar tudo como se todos fossem iguais e todos dependentes e subservientes ao seu pensamento. Assim ele respeitava o comportamento das pessoas, as mensagens oriundas das comunidades principalmente nos convites de suas festas, as ornamentações dos templos, os tipos de imagens, a arquitetura própria das construções das capelas e muito mais. Padre Julião nunca tentou padronizar as manifestações culturais e muito menos tolher a criatividade, pois sabia que uma cabeça só não pode direcionar o pensamento de grupos heterogêneos, principalmente numa comunidade de nível intelectual elevado.Ele não queria a religião para seu ego ser enaltecido, mesmo porque sabia claramente como está na Bíblia Sagrada que quem se exalta ser humilhado e quem se humilha será exaltado.Agora no dia 13 de dezembro completam 30 anos que o Governador da Bahia assinou a Lei número 3751, que reconheceu de utilidade publica o Centro Promocional Rural da Bahia – CEPRUB – criado por Padre Julião em 01 de abril de 1978.Padre Julião gostava das pessoas, gostava de viver, amava a todos indistintamente quer fossem pobres ou detentores do poder e do dinheiro, não se filiava nem defendia partidos políticos e acima de tudo sorria, porque ele tinha consciência exata de que quem não sorri deve ser imediatamente levado ao hospital porque está muito doente.

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